Conta-se que, no tempo da guerra entre
a Rússia e o Japão, certa tarde, após cessarem
os bombardeios, junto à linha de fogo
surgiu uma criança perscrutando, com o olhar
curioso e indagador, como quem procura descobrir
um semblante saudoso e querido
naquele triste campo de batalhas.
Ao ver a pequena, um bravo soldado japonês
que podia dominar a língua eslavo-oriental,
tomando em suas mãos calosas as acetinadas
mãozinhas da criança, indagou com ternura:
-O que deseja, minha pequena?
Está procurando algo no meio da tropa?
Quem é você? De onde vem? Qual é o seu nome?
-Meu nome é Lina. Estou procurando o papai,
que há muito tempo não vejo.
Sinto tanta saudade e desejava vê-lo agora.
-Que pena... O seu papai já não está mais aqui.
Ele seguiu em frente. Posso lhe dar algum recado?
Fale-me como ele é e vou procurá-lo e dar suas notícias.
Está bem?
-É fácil distinguí-lo... Meu pai é alto, forte,
tem olhos azuis como os meus e um bonito rosto barbado.
Os cabelos também são loiros.
E a criança, esperançosa, tirou do bolsinho
do avental uma foto do pai, dizendo sorridente:
-Dou-lhe esta foto para que o reconheça.
Ele se chama Ivan.
O soldado, comovido, colocou o retrato
no bolso da sua túnica e indagou com enorme carinho:
-Bem, agora qual é o recado que vai deixar
comigo para o seu papai?
-Não é nenhum recado que eu quero que lhe dê...
-Então o que é?
Pode falar que eu prometo fazer o que pede.
-Sim, eu quero que chegue juntinho dele
e entregue esse meu beijo.
Assim dizendo, a pequena pulou ao colo
do soldado e beijou-lhe o rosto umedecido
pelas lágrimas e voltou correndo por
onde havia chegado.
Durante toda aquela noite foi intenso
o bombardeio e num assalto a tropa
japonesa conquistou o inimigo.
Os feridos começaram a ser recolhidos indistintamente.
Nisto, aquele soldado japonês viu passar,
carregado, um soldado cujas feições
se assemelhavam muito às da criança.
Tirou a foto do bolso e conferiu.
Não havia dúvidas. Era ele.
O soldado o chama:
-Ivan?
-O que deseja?
-respondeu o russo ferido.
-Trago comigo um carinhoso beijo que Lina,
sua filhinha lhe enviou.
Dizendo isto, beijou a fronte do inimigo ferido
e o abraçou ternamente.
Não havia ali lugar para o ódio...
Foi o que aprendeu com Lina.
(Rita de Cassia - Boa Esperança - ES.)
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